Bandeira do Movimento Geraizeiro, Encontro de Lideranças da Articulação Rosalino Gomes
Montes Claros - MG, 2015
por Sara Gehren
Sementes Crioulas do banco de sementes sob os cuidados de Lúcia
Comunidade Sobrado, Rio Pardo de Minas - MG, 2018
por Sara Gehren
Geraizeiros
Os Geraizeiros possuem uma identidade distinta por sua fluidez e movimento, em um processo de constante ressignificação. Formada também a partir da resistência aos avanços do capital agrário empresarial sobre o campo, sua identidade se afirma na defesa e convívio com o território ancestral dos Gerais, composto majoritariamente pelo bioma do Cerrado. Dele, os geraizeiros tiram seu sustento, seu alimento, sua fonte de água e é a partir dele que se fazem suas manifestações culturais, religiosas, seus costumes cotidianos. O povo geraizeiro se organiza em pequenas propriedades rurais e áreas comunitárias de plantio, convívio, sociabilidade e religiosidade. Se colocam a partir das relações familiares dentro de cada comunidade e nas formas como elas se articulam e dialogam, nos convívios cotidianos e no planejamento de ações políticas organizadas pelo Movimento Geraizeiro.
 Uma das grandes motivações para a necessidade de se organizar politicamente é a luta pela preservação da água no Cerrado, bioma conhecido como “caixa d’água do Brasil”, por sua concentração de importantes nascentes que beneficiam oito das doze grandes bacias hidrográficas do país. Esta relevante configuração sofre sob os avanços, na região do norte mineiro, da monocultura de eucalipto e dos projetos de mineração de ouro e ferro. Em menos de 50 anos, o Cerrado já perdeu quase 50% de sua vegetação original, desencadeando no secamento de nascentes e severos desequilíbrios hídricos nos rios que abastece. Vendo este processo de devastação de perto, os povos geraizeiros colocam a defesa das águas como questão central em sua luta, com conquistas importantes que permitiram a sobrevivência de suas nascentes, mesmo em tempos de seca nas cidades.
As Conferências Geraizeiras são parte das estratégias que as comunidades adotaram para determinar as pautas da luta política no enfrentamento ao capital agrário e na defesa do meio ambiente. A primeira conferência ocorre em 2006, um ano antes do governo federal reconhecer os geraizeiros como povos tradicionais, através do Decreto nº 6.040, parte da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.
A história de luta do povo geraizeiro já apresenta muitas vitórias, a despeito dos enormes obstáculos políticos e econômicos que enfrentam. O reconhecimento de sua identidade, a proteção de seus territórios e a demarcação autônoma de suas terras, com reconhecimento do poder público, são algumas delas. Tudo isso é fruto da inventividade e flexibilidade das comunidades em dialogar com os canais institucionais do Estado e, ao mesmo tempo, realizar ações com suas próprias mãos.
Comunidade Água Boa II
Rio Pardo de Minas - MG
Deca e Seu Antônio caminham no Areião, parte da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Nascentes Geraizeiras.
por Breno Lima I 2018
Deca sentado ao lado da nascente preservada por sua comunidade e seus modos de vida.
Por Sara Gehren I 2018
Água Boa II é uma das comunidades nas proximidades do município de Rio Pardo de Minas integradas à Reserva de Desenvolvimento Sustentável Nascentes Geraizeiras. A oficialização em 2014 do que se tornou a primeira RDS geraizeira é fruto de uma luta de 11 anos travada pelas comunidades da região em nome da proteção e do uso coletivo do território.
Entre articulações com entidades parceiras e ações diretas de enfrentamento, os geraizeiros encararam as elites políticas e econômicas da região, especialmente vinculadas à monocultura de eucalipto. Uma vitória importante que transborda o território geraizeiro, com as comunidades garantindo a preservação e a reconstrução da parte do Cerrado desmatada e das nascentes que desaguam no Rio Pardo, que abastece a cidade. Ainda pode-se ver as marcas deixadas pelas invasões e tentativas de apropriação da terra por empresários. Um largo lote do Areião, área hoje já sob a proteção da Reserva, permanece devastado, rubro de terra mexida e vegetação morta. Do espaço desmatado, é possível ver uma larga plantação de eucaliptos no horizonte. Ao redor, o Cerrado protegido mostra a diferença das propostas defendidas.
Invasões, ameaças, greves de fome, viagens à Brasília, vigílias que pararam tratores, são alguns dos episódios da longa história de resistência dos geraizeiros de Água Boa II. O decreto que criou a Reserva, no entanto, não foi o ponto final dessa história. Ainda hoje, a pressão do capital empresarial recai sobre os geraizeiros cotidianamente, tornando a luta pela manutenção do meio ambiente um esforço contínuo.
Comunidade Sobrado
Rio Pardo de Minas - MG
Seu Sabiá, liderança comunitária, guia até a nascente Caiçara. No caminho até lá, todo encanamento feito pela própria comunidade para seu abastecimento.
Por Sara Gehren
José foi o guia de uma caminhada de 9 horas até a nascente Nogueira e logo no início disse:
"A coisa mais bonita que se pode ver é águas no rio correndo".
Por Sara Gehren
Sobrado é outra das comunidades geraizeiras nos arredores de Rio Pardo de Minas. Sua história de luta ganha destaque no início dos anos 2000, quando empresários invadem seu território e começam uma produção de carvão ilegal e pasto para gado na área de recarga dos rios Caiçara e Nogueira, que abastecem a comunidade e desaguam no Rio Pardo. O avanço do desmatamento promovido pelos invasores afeta as nascentes e obriga a comunidade a se mobilizar para proteger seu território e seu modo de vida. Apesar das tentativas de diálogo e os recursos às instituições serem frustrados, a comunidade saiu vitoriosa deste embate, através de ações diretas de enfrentamento. A partir da saída dos empresários, começa o processo de reconstrução da área desmatada e de proteção das nascentes. Hoje, a mata original já retomou parte do que havia se tornado pasto mas ainda pode ser vista, submersa em mato alto, a casa abandonada pelos invasores.
A partir do confronto e com a organização dos moradores de Sobrado, uma abertura de diálogo com o poder municipal de Rio Pardo de Minas resultou na Lei Municipal nº 1.629 de abril de 2015, ou Lei João Tolentino, que reconhece as identidades e direitos de Sobrado e de outras comunidades sobre o território que ocupam. Esta é a primeira lei municipal do país sobre o tema e, apesar de não validar formalmente a demarcação do território geraizeiro, reconhece o processo de autodeterminação da comunidade e de seu território e coloca sobre o poder público o compromisso de avançar no sentido da demarcação. A partir da delimitação do território, a Associação Tradicional Geraizeira de Sobrado espera obter a demarcação de pelo menos 1.128 hectares, beneficiando não apenas as 63 famílias de Sobrado, mas também as demais comunidades residentes ao longo do Rio Pardo e que dependem da proteção das nascentes para garantir o abastecimento de água.
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